segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Escrito por em 15.1.18 com 0 comentários

Os Nibelungos

Quando eu era criança, na casa da minha avó, tinha uma coleção de livros com umas ilustrações muito bizarras. Eram uns seis ou sete, cada um com uma capa de uma cor (um verde, um azul, um amarelo etc.), e no estilo "enciclopédia sobre todos os assuntos": cada um deles podia ter, em um mesmo volume, a biografia resumida de uma figura histórica, as regras de um esporte, a resenha de um livro, enfim, mais ou menos como se o átomo fosse encadernado e vendido. Esse tipo de coleção era comum quando eu era criança - a mais famosa era a Conhecer - embora eu suspeite que esses livros fossem mais antigos, tipo da década de 1960 ou 1970, por causa do estilo das ilustrações que eles traziam, bastante diferentes das encontradas nas coleções da década de 1980, aquela na qual eu vivia na época.

Enfim, eu não me lembro o nome da coleção - pelo que eu me lembro, aliás, os livros nem tinham nome na capa - mas, de início, eu gostava de folheá-los por causa das figuras, e depois decidi começar a ler alguns de seus textos. Um deles, o de capa verde se eu não me engano, tinha uma seção dedicada a Os Nibelungos, com um resumo da história e uma ilustração meio tosca de Siegfried matando o dragão. Como lá não dizia do que se tratava, eu supus que fosse um livro, e até procurei para comprar; somente anos mais tarde é que eu descobri se tratar de uma história mitológica, o que provavelmente explica o porquê de eu jamais ter encontrado o livro.

Essa semana, eu comprei alguns DVDs de filmes antigos, e, dentre eles, havia uma versão muda de Os Nibelungos. Fiquei muito satisfeito de encontrar uma nova versão que eu não conhecia para aquela história que fez parte da minha infância (eu já tinha outra versão em DVD, mas bem mais recente), e decidi escrever um post para celebrar. Hoje, portanto, é dia de Os Nibelungos no átomo!

A primeira versão de Os Nibelungos é uma história mitológica, transmitida através da tradição oral, mais ou menos como ocorre com as histórias da mitologia grega. Originária da região da Germânia, onde hoje está localizada a Alemanha, a história original era sobre a Família Real dos Burgúndios, cuja capital de seu reino era a cidade de Worms, que existe até hoje, e fica no sudeste da Alemanha, sendo cortada pelo rio Reno - por sobre o Reno, aliás, existe hoje, em Worms, uma ponte chamada Ponte dos Nibelungos, em homenagem à história. A razão pela qual a história se chama Os Nibelungos se perdeu no tempo; o tesouro da Família Real, nela, se chama "O Tesouro dos Nibelungos", mas não é dada nenhuma razão para esse nome - a maioria dos estudiosos acredita que "Nibelungos" era o nome do povo originalmente dono do tesouro, que depois teria sido roubado ou tomado pelos Burgúndios. A história é ambientada nos séculos V e VI, e sua menção mais antiga está em um poema datado do ano 920; alguns personagens são reais, existindo registros históricos de suas vidas, mas outros, aparentemente, são inventados.

Vale citar, também, que a história de Os Nibelungos possui uma versão nórdica, que pode ser encontrada em duas fontes. A primeira é um poema chamado Atlakviða, mas cujo personagem central é Átila, o Huno, e não Siegfried, herói da versão germânica - a história, entretanto, apesar do ponto de vista diferente, é a mesma. A segunda é a saga islandesa Völsunga, que fala sobre a ascensão e o declínio do clã Völsung, mas que possui uma parte devotada a Siegfried (lá chamado Sigurd) e Brünhild (lá chamada Brynhild), ambos personagens centrais de Os Nibelungos. A Völsunga teria sido uma das principais inspirações para um dos livros de J.R.R. Tolkien, A Lenda de Sigurd e Gudrún.

Em algum momento que ninguém sabe quando foi, alguém que ninguém sabe quem é decidiu escrever uma versão da história mitológica - que, como vimos, até então só existia de forma oral. Essa pessoa cujo nome se perdeu no tempo produziria uma série de manuscritos hoje conhecidos como Nibelungenlied, "A Canção dos Nibelungos", que depois seriam copiados por outros autores, ajudando a espalhar a história. Existem, ainda hoje, 35 manuscritos, embora alguns outros - logo os mais completos - tenham se perdido no final do século XVI; a maioria deles pertence ao século XIII, e foi encontrada somente no século XVIII. Nem todos os manuscritos contêm exatamente a mesma história, ou seja, conforme os demais autores copiavam do original (que, hoje, ninguém sabe qual é), alteravam algumas de suas partes, embora a essência central tenha permanecido sempre a mesma. Quase todos os manuscritos estão escritos em alemão medieval, mas alguns estão escritos em holandês. Onze dos manuscritos estão quase completos, os outros 24 consistem de apenas trechos.

A história dos manuscritos da Nibelungenlied, talvez por ser a que existia em forma escrita, se tornaria a versão mais famosa de Os Nibelungos. Ela é dividida em duas partes, com a primeira sendo centrada em Siegfried, e a segunda em sua esposa, Kriemhild (que, no livro da minha avó, se chamava Cremilda, então eu costumo chamá-la por esse apelido carinhoso). Kriemhild é irmã do Rei da Burgúndia, Gunther, e irmã dos príncipes Gernot e Giselher. No início da história, Kriemhild sonha com um falcão sendo abatido por uma flecha, e sua mãe lhe diz que isso é um sinal de que seu marido morrerá de forma violenta. Apavorada, ela faz votos de que jamais vai se casar. Isso seria mais fácil se ela não fosse a mulher mais bonita de toda a Burgúndia, e não atraísse pretendentes de todos os cantos do planeta, mas, ainda assim, ela se mantém irredutível, e rejeita todos eles.

Surge, então, nosso herói Siegfried. Príncipe herdeiro de Xanten, Siegfried decidiria levar uma juventude simples, vivendo como aprendiz de ferreiro em uma choupana às margens do Reno enquanto treinava suas habilidades com a espada. Quando acredita que ele está pronto para o mundo, seu mestre, Mime, aconselha que ele retorne a Xanten e reclame seu trono. No caminho, porém, Siegfried escuta a história do dragão Fafnir, que vive nas redondezas, e que, segundo a lenda, quem se banhar em seu sangue se tornará invulnerável. Siegfried decide fazer uma paradinha para matar o dragão antes de retornar a Xanten, e, após fazê-lo, aproveita que o sangue do monstro se depositou em uma espécie de piscina natural, tira toda a sua roupa e entra lá. Para azar de Siegfried, entretanto, bem quando ele está entrando na piscina de sangue, cai uma folha de uma árvore em suas costas, fazendo com que o corpo do herói se torne totalmente impenetrável, exceto por aquele pedacinho onde a folha ficou.

Depois de matar o dragão, no caminho para Xanten, Siegfried se envolve em outras aventuras, que não são descritas nos Nibelungenlied, apenas citadas quando ele é apresentado na corte da Burgúndia. Em uma dessas aventuras, ele derrota dois irmãos que estavam discutindo por causa de um tesouro - o Tesouro dos Nibelungos - e o clama para si; em outra, ele derrota um assaltante que, para que Siegfried não o mate, permite que ele fique com uma capa especial que torna o usuário invisível. Após essas aventuras, sabendo da beleza de Kriemhild e de seu voto de que ela jamais se casará, ele decide ir até Worms e tentar a sorte. Lá, ele é bem recebido, mas Gunther não permite que ele conheça Kriemhild. Para provar que é um aliado valoroso, Siegfried decide ficar e ajudar Gunther a derrotar um exército saxão que tenta invadir a Burgúndia.

Ao ver Siegfried em batalha, Hagen von Tronje, principal guerreiro do exército de Gunther e seu principal conselheiro, tem uma ideia: Gunther é apaixonado por Brünhild (que, no livro da minha avó, se chamava Brunilda), a Rainha da Islândia. O problema é que ela só aceita se casar com quem derrotá-la em três provas - arremesso de lança, arremesso de pedregulho e salto em distância - o que não seria nada de mais se não fossem dois detalhes: o primeiro é que Brünhild é absurdamente forte, e ninguém jamais conseguiu derrotá-la; o segundo é que quem tenta derrotá-la e não consegue é condenado à morte, por isso Gunther nunca tentou. Hagen propõe que Siegfried ajude Gunther a derrotar Brünhild, e, em troca, receberá a mão de Kriemhild em casamento, ao que Siegfried e Gunther concordam. Ao saber que Siegfried é invulnerável, Kriemhild se anima, pois ele seria um marido que não sucumbiria à previsão de seu sonho.

Na Islândia, Siegfried faz uso de sua capa da invisibilidade para ajudar Gunther a derrotar Brünhild nas três provas. Sem escolha, ela aceita se casar com ele, mas desconfia de que alguma coisa está errada. Satisfeito, Gunther declara que Siegfried agora é seu Irmão de Sangue, e lhe confere a mão de Kriemhild. Brünhild volta com eles para Worms, e os dois casais - Gunther e Brünhild, Siegfried e Kriemhild - se casam no mesmo dia. Brünhild, contudo, se recusa a deixar Gunther dormir com ela, e, toda vez que ele tenta, como ela é muito mais forte, o derrota e o amarra. Após várias tentativas, Gunther, já irritado por não conseguir consumar seu casamento, pede ajuda a Siegfried; o plano é que Siegfried se vista com as roupas de Gunther, e, no escuro, derrote e amarre Brünhild, como ela faz com ele. Gunther pede para que Siegfried não durma com Brünhild, apenas a derrote, mas, na hora do vamos ver, o texto dá a entender que ele não respeita esse pedido. De qualquer forma, Siegfried toma o anel e o cinturão de Brünhild, e os dá de presente a Kriemhild; Brünhild, envergonhada por ter sido derrotada, deixa de resistir a Gunther, e permite que ele consume seu casamento. Depois disso, ela passa a ser uma esposa absurdamente infeliz, somente andando cabisbaixa e obedecendo a todas as ordens do marido, como se não tivesse vontade própria. Sem mais o que fazer em Worms, Siegfried leva Kriemhild para morar com ele em Xanten.

Anos se passam, e, um dia, Siegfried e Kriemhild vêm a Worms visitar Gunther. Quando Brünhild e Kriemhild estão indo para a Catedral rezar, as duas iniciam uma discussão sobre quem deveria entrar primeiro, pois, na opinião de Brünhild, Siegfried é vassalo de Gunther, então ela tem precedência. Irritada, Kriemhild mostra a Brünhild o anel e o cinturão que um dia foram dela, e revela que quem a derrotou, tanto nas provas quanto na noite de núpcias, foi Siegfried. Humilhada, Brünhild pede a morte de Siegfried, mas Gunther se nega, alegando que eles são Irmãos de Sangue. Ela, então, começa uma greve de fome, e ameaça contar a todos reinos rivais que Gunther é fraco e impotente. Hagen von Tronje, achando que isso pode ser uma ameaça ao reinado de Gunther, decide ele mesmo matar Siegfried, inventando que a Burgúndia está novamente em guerra e que Gunther precisa da ajuda do amigo. Como Siegfried é invulnerável, Hagen vai conversar com Kriemhild para ver se ele tem algum ponto fraco, e, ao saber da história da folha, pede para que ela marque o local na túnica de Siegfried, com o pretexto de que, assim, poderá protegê-lo melhor.

Durante a falsa batalha, Hagen arremessa uma lança que atinge o ponto vulnerável, matando Siegfried. Ao retornarem a Worms, Kriemhild percebe sua traição e jura vingança, e, para que ela não use o tesouro do marido para contratar um exército, Hagen o joga no Reno. Brünhild, para que Gunther não saia vitorioso mesmo após a morte de Siegfried, se mata com a própria espada enfiada na barriga.

Anos se passam, e Kriemhild ainda não se esqueceu da traição de Hagen, procurando sem sucesso por uma forma de se vingar. Um dia, Átila, o Rei dos Hunos (chamado de Etzel, seu nome em alemão, nos manuscritos), a pede em casamento, e ela aceita. Ela tenta convencer o marido a usar seu exército para atacar a Burgúndia, mas novamente sem sucesso. Mas, quando nasce o primeiro filho do casal, ela o convence a convidar toda a corte da Burgúndia para o batizado; quando todos estão presentes, Kriemhild arranja para que uma briga entre soldados hunos e burgúndios comece, que logo escala para uma batalha entre as duas cortes - na qual Kriemhild não ficará satisfeita até que Hagen confesse seu crime e revele onde escondeu o tesouro. A batalha sai do controle, porém, e não somente todos os irmãos de Kriemhild, incluindo o Rei Gunther, são mortos, mas também o filho de Átila e Kriemhild é assassinado por Hagen. Furiosa, Kriemhild corta a cabeça de Hagen, mas acaba também morrendo, pelas mãos do revoltado Hildebrand, conselheiro de Átila e pai da esposa de Giselher, que jamais concordou com o plano de Kriemhild, e achou um completo absurdo tantos terem de morrer para satisfazer sua vingança. Com a morte de Kriemhild, toda a linhagem da Casa Real da Burgúndia se encerra.

A Nibelungenlied é considerada uma das mais famosas e importantes histórias do povo alemão, comparada por críticos à Ilíada, e usada incontáveis vezes no passado pelo governo como propaganda para inflamar o povo, inclusive na época da Primeira Guerra Mundial, quando a expressão Nibelungentreue ("lealdade nibelunga") foi usada para descrever a aliança entre a Alemanha e a Áustria, e pôsteres com a figura de Siegfried apunhalado em seu ponto vulnerável criticavam o acordo de paz de 1918, cujos críticos consideravam que a Alemanha havia sido apunhalada nas costas por seus aliados. Os nazistas, na Segunda Guerra Mundial, também frequentemente se utilizavam de expressões de seu texto e de ilustrações de suas passagens para motivar as tropas, com vários cartazes tendo Siegfried em destaque tendo sido distribuídos durante a Batalha de Stalingrado.

Sendo uma obra tão famosa, é claro que ela teria várias adaptações. A mais antiga é uma ópera, composta pelo alemão Richard Wagner entre 1848 e 1874, com o nome de O Anel dos Nibelungos (Der Ring des Nibelungen). A ópera possui quatro partes, chamadas Das Rheingold ("O Ouro do Reno"), Die Walküre ("As Valquírias"), Siegfried e Götterdämmerung ("O Crepúsculo dos Deuses"), sendo que a segunda parte conta com uma das composições mais famosas de Wagner, A Cavalgada das Valquírias. A ópera possui um total de 15 horas de duração, o que torna impossível que as quatro partes sejam apresentadas em sequência; Wagner as compôs para que fossem apresentadas em quatro noites seguidas, mas, hoje, é comum que haja um intervalo maior entre elas, ou que apenas uma das partes seja montada. Wagner não seria muito fiel ao texto dos Nibelungenlied, acrescentando à história vários elementos da Völsunga, e criando outros por conta própria - como o tal anel do título, que pertence ao anão Alberich, guardião do tesouro dos Nibelungos, e torna quem o tiver no dedo imortal. Como frequentemente acontece nesses casos, porém, vários elementos da ópera de Wagner se tornariam parte do imaginário popular, com grande parte das pessoas não sabendo que eles não faziam parte da obra original.

No início do século XX, o diretor de cinema Fritz Lang (de Metrópolis) decidiria fazer uma adaptação cinematográfica de Os Nibelungos, o mais fiel possível à Nibelungenlied. Para que não ficasse um filme demasiadamente longo, ele faria dois, o primeiro indo até a morte de Siegfried e Brünhild, e o segundo começando com o casamento de Kriemhild e Etzel. Lang e sua esposa, Thea von Harbou, co-escreveriam o roteiro da primeira parte, mas von Harbou sozinha escreveria a segunda. Ambos os filmes são em preto e branco e mudos, mas possuem alguns dos efeitos especiais mais fantásticos já vistos em sua época - incluindo o dragão Fafnir, que cuspia fogo e tudo, e não deixa nada a dever a dragões de produções mais modernas. O primeiro filme, Die Nibelungen: Siegfried (conhecido em português como "A Morte de Siegfried"), estrearia na Alemanha em 14 de fevereiro de 1924, enquanto o segundo, Die Nibelungen: Kriemhilds Rache ("A Vingança de Kriemhild"), estrearia em 26 de abril do mesmo ano. O elenco conta com Paul Richter como Siegfried, Margarete Schön como Kriemhild, Hanna Ralph como Brünhild, Theodor Loos como Gunther, Hans Adalbert Schlettow como Hagen von Tronje, Georg John como Mime, Erwin Biswanger como Giselher, Rudolf Klein-Hogge como Etzel, Georg August Koch como Hildebrand, e Rudolf Rittner como Rüdiger, que, no filme, é conselheiro de Etzel, pupilo de Hildebrand e pai da esposa de Giselher, e se mata após ser forçado a atacar os burgúndios e matar o próprio genro.

Os filmes de Lang foram grandes sucessos de público e crítica, sendo considerados obras-primas do expressionismo alemão. Como aconteceu com muitos filmes da época, porém, eles não foram corretamente preservados, pois não havia uma preocupação de se guardar as obras para o futuro. Os negativos originais mofaram e ficaram além de qualquer reparo, e as cópias existentes ou estavam em péssimo estado ou bastante editadas. Durante muito tempo, as melhores versões disponíveis contavam com 143 e 145 minutos, respectivamente, mas nelas estavam faltando vários dos intertítulos (aquelas telas pretas nas quais a narração e os diálogos aparecem escritos nos filmes mudos) e, quando comparadas a cópias sobreviventes dos roteiros originais, via-se que elas não correspondiam exatamente às versões originais dos filmes, com alguns elementos do primeiro filme tendo sido adicionados ao segundo.

Em 2010, a Fundação F.W. Murnau, mais importante organização dedicada à preservação de filmes cinematográficos da Alemanha, começaria um grande esforço para encontrar a maior quantidade possível de cópias dos filmes na Europa, e, através delas, começaria um grande processo de restauração, que levaria por volta de cinco anos, e resultarias nas versões dos filmes o mais próximas possível às originais - mas, ainda assim, não idênticas, sendo que um dos motivos para se determinar o que falta é a ausência de informações sobre a duração dos filmes originais, sendo usado como única base de comparação o roteiro original. Essas versões da Murnau possuem, respectivamente, 150 e 131 minutos, estão disponíveis em DVD, e foram as que me motivaram a escrever esse post.

Na década de 1960, o produtor alemão Arthur Brauner decidiria fazer um remake dos filmes de Lang, mas dessa vez coloridos e falados, usando o roteiro original de Lang e von Harbou como base. Brauner desejava que o próprio Lang dirigisse o novos filmes, mas o diretor foi energicamente contra, o que levaria o produtor a contratar Harald Reinl, o mais bem sucedido diretor da Alemanha Ocidental na época, para o projeto. Os novos roteiros ficariam a cargo de Reinl, Harald G. Petersson e Ladislas Fodor, mas seguiriam os originais quase passo a passo. Após uma pesquisa que determinou que o público preferiria que Siegfried fosse interpretado por um ator desconhecido, Brauer convidaria o atleta Uwe Beyer, Medalha de Bronze no arremesso do martelo nas Olimpíadas de 1964, para o papel; Beyer, porém, não tinha nenhuma experiência prévia como ator, e seu desempenho deixou tanto a desejar que ele acabou sendo dublado pelo ator Thomas Danneberg na pós-produção. O restante do elenco era formado por Maria Marlow como Kriemhild, Karin Dor como Brünhild, Rolf Henniger como Gunther, Siegfried Wischnewski (ora vejam só) como Hagen, Dieter Eppler como Rüdiger, e três atores norte-americanos, Terence Hill como Giselher, Skip Martin como Alberich e Herbert Lom (o nome mais famoso do elenco) como Etzel.

O primeiro filme, chamado Die Nibelungen: Siegfried von Xanten, teria 91 minutos e estrearia em 13 de dezembro de 1966; o segundo, chamado, assim como o original, Die Nibelungen: Kriemhilds Rache, teria 90 minutos, e estrearia em 16 de fevereiro de 1967. O primeiro filme seria um grande sucesso de público, o segundo nem tanto, mas ambos seriam fracassos retumbantes de crítica, com o primeiro sendo considerado infantil, ingênuo e cômico, e o segundo, "pouco mais que uma contagem de corpos". Em 1976, talvez para comemorar os dez anos de lançamento do original, Brauner condensaria ambos os filmes em uma única versão de 110 minutos, lançada no cinema com o nome de Die Nibelungen; essa versão seria considerada pela crítica ainda pior que os filmes originais, com alguns críticos dizendo que a edição deixou os filmes sem pé nem cabeça. Para evitar confusão com os filmes originais de Lang, desde 1982, quando foi exibida pela primeira vez na televisão, a "versão única" dos filmes de Brauer - em mais de um sentido, já que também é a única que existe hoje em DVD - seria renomeada para Das Schwert der Nibelungen ("A Espada dos Nibelungos"), nome pelo qual é conhecida até hoje.

A versão mais recente de Os Nibelungos (que eu também tenho em DVD), foi concebida como uma minissérie em duas partes para a TV, exibida originalmente na Alemanha em 29 e 30 de novembro de 2004, com um total de 222 minutos. As duas partes seriam condensadas em um único filme de 162 minutos, que estrearia nos cinemas do Reino Unido antes mesmo da estreia na TV alemã, em 19 de novembro de 2004. O título original da minissérie em alemão era, simplesmente, Die Nibelungen, mas, em inglês, a coisa fica um pouco complicada: quando foi exibido nos cinemas do Reino Unido, o filme ganhou o título Ring of the Nibelungs ("O Anel dos Nibelungos"), mas, quando foi exibido na TV, pelo Channel 4, em dezembro de 2005, o canal resolveu mudar seu título para Sword of Xanten ("A Espada de Xanten"). Quando o filme foi ser exibido pela primeira vez nos Estados Unidos, pelo Sci Fi Channel, em março de 2006, eles mudaram o título de novo, para o bizarro Dark Kingdom: The Dragon King ("Reino Sombrio: O Rei Dragão"), título com o qual ele também foi lançado em DVD por lá. No Reino Unido, por outro lado, o filme seria lançado em DVD com o título Curse of the Ring, e foi esse que escolheram traduzir por aqui, com o filme em português se chamando A Maldição do Anel.

Se me permitem uma pausa para uma informação pessoal, aqui no Brasil A Maldição do Anel foi exibido pela primeira vez em sua forma original de minissérie, se não me engano, pela HBO, no rastro do sucesso no cinema de O Senhor dos Anéis. Eu resolvi assistir por acaso, sem nem saber o que era, e fiquei empolgadíssimo quando vi que se tratava da história de Os Nibelungos. Procurei o DVD para comprar durante anos, mas, infelizmente, ele foi lançado por aqui em versão apenas para locadoras, sem versão para o consumidor particular. Acabei o encontrando há poucos anos, em uma loja de usados - com um adesivo com o nome de uma locadora e tudo. Infelizmente, é a versão condensada, mas é melhor que nada.

Dirigido por Uli Edel, A Maldição do Anel é até bastante fiel á história da Nibelungenlied, mas faz algumas alterações, como transformar o fato de a população da Europa ainda estar se convertendo ao cristianismo na época em que a história se passa de apenas um detalhe para um ponto crucial; além disso, em A Maldição do Anel, Brünhild conhece e se apaixona por Siegfried antes mesmo de ele ajudar Gunther a vencê-la, o que cria um triângulo amoroso entre os dois e Kriemhild - que usa uma poção do amor para que Siegfried se apaixone por ela. O Anel do título faz parte do Tesouro dos Nibelungos, que Siegfried encontra após derrotar o dragão Fafnir, e, como o título dá a entender, é amaldiçoado, trazendo ruína a quem o colocar no dedo. Finalmente, Siegfried não vai morar com o ferreiro (que, no filme, se chama Eyvind), por vontade própria, e sim porque é salvo por ele quando criança de um ataque a Xanden, que matou toda a sua família; para que Siegfried não seja reconhecido, Eyvind passa a chamá-lo de Eric, nome que ele usa durante todo o filme. Apenas a primeira parte da Nibelungenlied foi adaptada, com a história terminando com a morte de Siegfried e Brünhild. O elenco conta com Benno Fürmann como Siegfried/Eric; Alicia Witt como Kriemhild; Kristanna Loken (de O Exterminador do Futuro 3) como Brünhild, Max von Sydow (de uma centena de filmes, o nome mais famoso do elenco) como Eyvind, Samuel West como Gunther, Robert Pattinson (de Crepúsculo) como Giselher, e Julian Sands como Hagen.

Para terminar, vale citar que existe também uma versão italiana para o cinema, chamada Sigfrido: La Leggenda dei Nibelunghi, dirigida por Giacomo Gentilomo e contando com Sebastian Fischer como Sigfrido, Ilaria Occhini como Crimilde, Katharina Mayberg como Brunilde, Giorgio Constantini como Gunther e Rolf Tasna como Hagen. Assim como A Maldição do Anel, esse filme é baseado apenas na primeira parte, terminando com a morte de Sigfrido e Brunilde, e traz alguns elementos da ópera de Wagner. Com 93 minutos de duração, e tendo estreado em 1957 (embora eu não tenha conseguido descobrir a data exata), Sigfrido merece uma menção honrosa por causa de seu Fafnir, considerado um dos dragões mais impressionantes da história do cinema, criado por Carlo Rambaldi. Esse Fafnir seria tão impressionante que renderia a Rambaldi um convite para trabalhar em Hollywood; lá, ele faria parte da equipe de efeitos especiais do King Kong de 1976, de Alien: O Oitavo Passageiro, E.T.: O Extraterrestre e Duna, dentre outros, construindo uma carreira de sucesso no ramo.

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